2 de setembro de 2013

O Dinheiro (Robert Bresson, 1983)


Por que ainda consigo me surpreender com a frieza absoluta de Bresson? Por que ainda acho que, de algum jeito, Yvon não vai matar a família indefesa e principalmente a velhinha inocente? Será que não entendi ainda que Bresson é o único que está disposto a ir até o fim para mostrar sua reprovação à hipocrisia, a ganância e a falta de ética? Sim, o foco é o dinheiro (mais precisamente a nota falsa que inicia a tragédia toda), mas a visão de Bresson em seu último filme demonstra uma falta de esperança tão grande que acaba refletindo uma podridão da sociedade moderna que vai além da ganância pelo dinheiro e mostra uma espécie de disfunção ou mal-estar social que paira sobre os personagens sem nunca ter muita definição. Todos parecem moral e eticamente corruptos ou coniventes com a corrupção, numa teia que vai começa na mãe do menino contrabandeador e passa pelo dono da loja, os presos, os advogados, e chega até Yvon, que passa de homem honesto a assassino frio após perder tudo o que tinha na vida.

Bresson observa tudo impassível, e de alguma forma até a falta de uma reação mais enérgica dos personagens – em atuações mínimas, típicas de filmes de Bresson - acaba demonstrando a falta de esperança do próprio diretor e aumentando os ares de tragédia. Aqui todos parecem vítimas de alguma forma, desde Yvon – que perdeu emprego, família e mulher – até Lucien – que é condenado a se tornar vítima da própria consciência por Yvon, naquela que é talvez a sentença mais cruel do filme. O diretor filma com mais economia do que nunca em sua carreira, atingindo o fim de sua busca por capturar apenas o que é essencial nos fatos e nas informações apresentados, se recusando a manipular o espectador – seja com cores distrativas ou paisagens, trilhas sonoras ou closes, reviravoltas ou conflitos na narrativa - e deixando que ele reaja com mais naturalidade e liberdade através da eliminação dos excessos. Muitas vezes, esse método acaba potencializado a resposta emocional do espectador, principalmente nas cenas mais brutais (de violência tanto física quanto emocional). Aliás, a cena do machado no final do filme fecha a carreira de Bresson com chave de ouro, mantendo o espectador atento e tenso até a conclusão trágica, capaz de deixar qualquer um mudo, numa das melhores sequências filmadas pelo diretor.

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