De certa forma, Alabama Monroe pode ser visto como um exemplo raro de filme (ou pelo menos é difícil eu sair do cinema tão emocionado quanto quando vi o filme). Carregado de emoções fortes, mas demonstradas
de forma convincente e impactante, sem parecer enfeitadas ou falsas. Com uma
trilha sonora frequente e marcante, mas que não é usada para manipulações
fáceis. Com personagens que parecem sempre ser tratados com respeito, empatia e
até carinho, talvez.
Os (muitos) dramas do casal Elise e Didier são apresentados
numa narrativa que vai e volta na ordem cronológica, mas se divide entre três
momentos principais: início do romance, Maybelle (filha dos dois) contraindo
câncer e a crise no relacionamento (concentrada na segunda metade do filme). Essa
alternância entre tempos narrativos é arriscada, mas a montagem dá conta do
recado com boas transições, como quando uma cena em que Maybelle fala de como
sonha em se tornar uma cowboy no futuro é seguida de uma imagem dela já careca
por causa da quimioterapia. Em vez de conduzir as emoções de forma direta em
direção às notas mais tristes ou alegres como normalmente se faz, a montagem
intercala momentos tristes e felizes, o que tira a importância do impacto imediato
deles e faz esses momentos e suas cargas emocionais ressonarem entre si, ressignificando
uns aos outros como uma grande cadeia de lembranças ligadas umas às outras.
Desse modo, se valorizam as emoções da trajetória da história do casal e sua
trajetória de vida como um todo.
Na segunda parte do filme essa alternância diminuiu um
pouco, afinal de contas a terceira fase temporal só surge após a “conclusão” da
segunda fase, na metade do filme, o que prejudica o efeito hipnótico da
montagem. Mesmo assim, a terceira fase tem um punhado bem significativo de
emoções por si só, e aliada às lembranças recorrentes do passado (que geralmente
não são atribuídas diretamente a um dos personagens), faz a segunda metade se
segurar bem sem perder tanto assim. O problema é que os conflitos do casal gerados
após a perda da filha ficam um pouco restritos e limitados demais ao
questionamento da vida após a morte, desembocando num embate entre ciência e fé
quando poderiam ter mais variedade.
Se bem que o ponto-chave da música mais importante do filme,
“Will The Circle Be Unbroken”, é justamente o questionamento sobre o que nos
espera após a morte. Talvez o problema de ter músicas e performances musicais
que funcionam tão bem é que às vezes elas são mais eloquentes que o próprio
diálogo (principalmente no caso da música “Where The Soul Never Dies”). De
fato, as músicas são essenciais ao filme, servindo não só como plano de fundo
para a relação do casal (afinal eles tocam e cantam numa banda de bluegrass)
como expressando as emoções que pontuam o filme a sua própria maneira. A
começar pela trilha sonora original, sempre no estilo bluegrass/country que marca o filme, que dá o tom ou “mood" (geralmente melancólico) de certas cenas sutilmente, deixando para os atores a maior parte da carga dramática. Em paralelo estão as apresentações de Elise e Didier em sua banda de
bluegrass, não só porque as músicas (e suas letras) ajudam a demarcar as fases
do relacionamento do casal e revelar seus sentimentos, mas também porque as
próprias interpretações dessas canções são maravilhosas e um dos pontos altos
do filme junto com a ótima atuação da dupla de protagonistas, interpretados por Veerle Baetens e Jonah Heldenbergh. Mas o mais
importante é que a música em si (instrumental ou cantada) é colocada como
uma coisa realmente importante na vida desses personagens e nas suas histórias, de forma que o ato de tocá-la vai além de
algo trivial ou que o filme apenas menciona e se torna algo que serve como uma
maneira importante de expressão, trazendo alegria e paz ao espírito e ilustrando
a busca de cada um por algum tipo de salvação pessoal enquanto lidam com a vida
e a morte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário